Enquanto o povo de Israel vagava pelo deserto depois de ter saído da escravidão no Egito rumo à Terra Prometida, Deus orientou ao líder Moisés a construção de um santuário que os acompanhasse, detalhe por detalhe
Por 40 anos, o povo de Israel vagou pelo deserto rumo à Terra Prometida após ser libertado da escravidão no Egito. Nesse período, o povo nômade tinha regras, uma estrutura organizada, tanto quando estavam em movimento como quando estavam acampados.
Moisés, líder espiritual de seu povo, armava uma tenda especial para adoração a Deus fora do acampamento principal, e todos iam ter com ele para buscar ao Senhor. Na pequena cabana de tecido, Deus descia em forma de coluna de nuvem para falar com Moisés. Quando este subiu ao monte Sinai para receber as tábuas com os Dez Mandamentos, recebeu também de Deus as instruções para a construção do Tabernáculo, com regras expressas não só de sua confecção, mas também na forma como seria armado, a estrutura à sua volta e como seria transportado pelo povo nômade. Era uma espécie de templo itinerante feito de tecidos variados, tapeçaria, madeiras nobres e artefatos preciosos, armado no centro do acampamento.
O Tabernáculo era um centro de adoração, um lugar onde o povo poderia focalizar a presença do Senhor. Dessa forma, a pequena barraca fora do acampamento deu lugar a um complexo sagrado no meio das moradias improvisadas no deserto.
Deus descreveu a Moisés os detalhes da construção, inclusive quanto à quantidade e tipos – até mesmo cores – de materiais, que o povo ofertou. Eram tecidos raros de grande beleza, pedras e metais preciosos e, em sua maioria, materiais facilmente encontrados no deserto, como madeiras nativas de grande resistência e peles de animais locais – de criação ou silvestres. Até mesmo o figurino dos sacerdotes e demais trabalhadores foi orientado pelo Senhor, assim como os artefatos e a mobília.
“Então falou o SENHOR a Moisés, dizendo: Fala aos filhos de Israel, que me tragam uma oferta alçada; de todo o homem cujo coração se mover voluntariamente, dele tomareis a minha oferta alçada. E esta é a oferta alçada que recebereis deles: ouro, e prata, e cobre, E azul, e púrpura, e carmesim, e linho fino, e pelos de cabras, E peles de carneiros tintas de vermelho, e peles de texugos, e madeira de acácia, Azeite para a luz, especiarias para o óleo da unção, e especiarias para o incenso, Pedras de ônix, e pedras de engaste para o éfode e para o peitoral. E me farão um santuário, e habitarei no meio deles. Conforme a tudo o que eu te mostrar para modelo do tabernáculo, e para modelo de todos os seus pertences, assim mesmo o fareis.” Êxodo 25: 1-9
Embora um leitor da Bíblia completamente leigo tenha a tendência de localizar Jesus Cristo somente no que diz respeito ao Novo Testamento, o Messias já está previsto desde o início do Antigo Testamento. O próprio tabernáculo acaba sendo uma alusão clara a ele e à forma de contato do homem com Deus. Se pegarmos um desenho, uma “planta baixa” da tenda, vemos que os artefatos estão dispostos em forma de cruz, tendo acima dela a presença de Deus (na Arca da Aliança).
O Tabernáculo devia sempre ser erguido com sua entrada voltada para o oriente. Era uma grande tenda, como um grande
galpão, chamado de Santo Lugar. Dentro dele, o Santo dos Santos era uma pequena divisão reservada somente ao sumo sacerdote, onde ele falaria pessoalmente com Deus, protegido por um véu, cuja entrada estaria virada para o ocidente. Nele ficaria a Arca da Aliança, contendo as tábuas dos Dez Mandamentos dadas a Moisés (uma cópia lavrada por ele mesmo), um pouco de maná (alimento mandado por Deus dos céus para o povo no deserto) e a vara de Arão que florescera (Números 17. 6-9).
Conforme dita o livro de Êxodo em seu capítulo 25, nos versículos 10 a 22, Deus orientou a Moisés sobre a confecção da Arca da Aliança. O Propiciatório, que ficava em cima da Arca como se fosse sua tampa, trazia dois querubins de ouro voltados um para o outro, entre os quais Deus falaria a Moisés acerca de tudo o que ordenasse para seu povo. Assim como a Arca, o Senhor detalhou sobre o mobiliário do Tabernáculo e peças importantes como o Menorá, grande candelabro de ouro com sete luminárias a óleo que iluminaria o Santo dos Santos, que não tinha qualquer janela ou outra fenda por onde entrasse a luz, em que somente o sumo sacerdote entrava.
Graus de intimidade
Para o professor, teólogo e arqueólogo Rodrigo Silva, do Museu de Arqueologia Bíblica Paulo Bork, no município paulista de Engenheiro Coelho, a disposição física do Tabernáculo mostra os “graus de intimidade” do homem com Deus. Rodrigo também compartilha da opinião de que o próprio Jesus Cristo estava presente em todas as representações do templo itinerante.
Pátio Externo - Um aspecto interessante é que o Tabernáculo tinha apenas um lugar para entrada e saída, o portão principal voltado sempre para o leste, que dava acesso ao pátio externo. Assim como mostra a Bíblia, o próprio Jesus afirma:
“Eu sou a porta; quem entra por mim será salvo. Entrará e sairá, e encontrará pastagem.” João 10. 9
No pátio externo, totalmente descoberto, todos podiam entrar. A primeira estrutura encontrada era o altar de sacrifícios. Quando os animais oferecidos eram queimados, o ato simbolizava a expiação dos pecados. Morriam ali o pecado e as vontades meramente humanas, para renascer um homem puro. A fumaça que se desprendia do sacrifício subia aos céus:
“Depois queime o cordeiro inteiro sobre o altar; é holocausto dedicado ao Senhor; é oferta de aroma agradável dedicada ao Senhor, preparada no fogo.” Êxodo 29. 18
Logo depois, a pia em que os sacerdotes se lavavam após os sacrifícios e antes de entrar no Lugar Santo. Com forte simbolismo de purificação, nela eram lavados os pecados, publicamente.
Partindo da relação do grau de intimidade com Deus, citada por Rodrigo Silva, o pátio é o primeiro passo, uma experiência fundamental, sem a qual o homem não pode começar um relacionamento verdadeiro com o Senhor.
Lugar Santo – Logo depois da pia, havia a abertura para a tenda propriamente dita: a entrada do Santo Lugar. Somente os sacerdotes podiam entrar nele. Ali, os três artefatos de mobília eram de ouro puro, ou de madeira nobre adornada com o metal dourado. O ouro, para a cultura judaica, simboliza não somente a riqueza que primeiramente se percebe, mas também o caráter da eternidade de Deus, pela durabilidade do raro elemento mineral.
À direita de quem entrasse, a Mesa de Pães. Nela, doze discos de pão ázimo (sem fermento, pois o mesmo simbolizava o pecado para os judeus) eram colocados em duas pilhas de seis. Simbolizavam que Deus não deixaria de prover o alimento para as doze tribos de Israel, mas também a própria Palavra de Deus, por meio da qual Ele alimenta nosso espírito. Mais tarde, Jesus faria referência dele mesmo como o “Pão da Vida”.
Do lado oposto à mesa, o Menorá, grande candelabro de ouro com sete luminárias a óleo, utilizado até hoje pelos judeus tanto em grandes formatos quanto pequenos, com velas. Tinha a função de representar a presença de Deus, a luz da própria vida nEle, assim como iluminava o Santo Lugar, que não tinha janelas ou outra abertura por onde entrasse claridade. Os próprios sacerdotes eram os únicos que abasteciam o Menorá de óleo, mantendo-o sempre aceso.
Logo depois do Menorá e da Mesa de Pães estava o Altar de Incenso, no meio, de frente para a porta do Santo Lugar. Nele os sacerdotes oravam a Deus e acendiam os incensos, simbolizando as súplicas e orações que subiam aos céus, a Deus. Este contato mais próximo é um degrau a mais na intimidade com Deus, em que os sacerdotes levavam as súplicas dos fiéis ao Pai.
Santo dos Santos – O cerne de todo o Tabernáculo era o lugar no qual somente o sumo-sacerdote podia entrar, para um contato direto com Deus. Com a entrada protegida pelo véu, o líder dos sacerdotes conversava com o Senhor, depois passando a seus subordinados o assunto.
No claustro do Santo dos Santos estava encerrada a Arca da Aliança, objeto sagrado somente tocado pelos sacerdotes. Em seu interior, as tábuas dos Dez Mandamentos que Moisés lavrara orientado por Deus (a Palavra Divina), um bocado do maná que foi dado como alimento ao povo no deserto pela primeira vez (a provisão que nunca faltava) e a vara de Arão que florescera (o reconhecimento de Deus da autoridade conferida a alguém, comprovando que é a vontade dEle).
Sobre a Arca, o Propiciatório, grande prancha posicionada como a tampa do baú, com duas imagens de querubins voltadas uma para a outra com as asas esticadas, entre os quais Deus se posicionava para falar ao sacerdote.
“O véu não tinha uma função de bloqueio entre o homem e Deus”, diz Rodrigo Silva. Era uma forma de proteger o homem do contato mais próximo, que o ser humano ainda não tinha capacidade para entender. “Não era Deus se ocultando, como se brincasse de esconde-esconde. Era um jeito de Ele se revelar ao homem sem o destruir com Sua glória, que olhos humanos não têm a capacidade para enxergar. Era mais como um filtro, e não como uma barreira. Mas tal obstáculo se desfez com a vinda de Cristo e seu sacrifício por nós. Por isso falalamos que ‘o véu se rasgou’ e agora o homem não depende de sacerdotes para ter o contato direto com Deus”, explica o arqueólogo.
A doutrina do santuário
A palavra Tabernáculo, em sua origem, quer dizer morada, habitação. Deus habitando entre os homens.
Antes, erguiam-se altares para sacrifício e oração, que eram deixados e reerguidos na próxima parada do povo nômade de Israel. O Tabernáculo é a primeira referência de um santuário propriamente dito após o próprio Éden, quando o homem tinha contato direto com o Senhor, mas o perdeu pela desobediência.
O Tabernáculo já era um princípío da reconciliação entre o Senhor e o homem, mais tarde corroborada por Cristo. Rodrigo Silva resume bem tudo o que foi explicado até agora sobre o Tabernáculo. “A Palavra diz que Jesus veio ‘tabernacular’ entre os
homens; era Deus habitando entre nós em carne. Toda a conformação do santuário itinerante em forma de tenda tinha elementos que antecipavam a vinda de Cristo em todos os seus significados, além da evidente forma de cruz em que os móveis e artefatos eram dispostos quando vistos de cima. Se uma pessoa entende a doutrina do santuário, a forma como ele era feito e como funcionava, é capaz de entender o sentido de toda a Bíblia, de Gênesis ao Apocalipse. Parece complicado quando se olha o todo, mas essa simples relação revela o que Deus quer do homem e o que tem reservado para ele.”
O desejo de Davi
Desde o Egito até a Terra Prometida, o povo de Israel vagou pelo deserto acampando em torno de seu santuário portátil. O Tabernáculo era montado e, ao redor dele, as tribos eram dispostas em acampamento.
Quando Israel já tinha o seu lugar fixo, suas cidades propriamente ditas, em Jerusalém o então monarca ungido por Deus, Davi, nutriu em seu coração o desejo de construir um grande templo, um magnífico edifício para o que ele achava ser a morada de Deus entre seu povo.
Como Davi era em sua essência um guerreiro, portanto já tendo matado milhares em combate por seu povo, Deus não permitiu que ele construísse o tão almejado templo. Mas, atendendo aos insistentes desejos do coração do rei, o Senhor lhe disse que ele próprio não construiria, mas seu filho e sucessor no trono. No entanto, permitiu que Davi começasse a armazenar material para a futura edificação, tranquilizando o monarca. De fato, Salomão, filho de Davi, foi o realizador da obra que até hoje é reverenciada pelo povo judeu, mesmo após ter sido destruída.
O Tabernáculo nasceu diretamente da vontade de Deus, conforme orientado a Moisés. “Muitos acham que Moisés inovou, chamado por Deus para construir o Tabernáculo e elaborar costumes para a adoração”, alega Rodrigo Silva, “mas na verdade Deus usou o líder que orientava o povo de Israel pelo deserto para recuperar uma tradição que corria o risco de cair, de sumir, fazendo com que o santuário fosse construído e mostrasse a todo momento a presença dEle”, explica o especialista. Já o templo, segundo o professor, partiu da vontade de Davi, uma intenção do coração do rei, que Deus autorizou, atendendo o pedido de seu ungido, mesmo que um dia viesse a ser construído por seu sucessor.
“Quando Hirão, rei de Tiro, soube que Salomão tinha sido ungido rei, mandou seus conselheiros a Salomão, pois sempre tinha sido amigo leal de Davi.
Salomão enviou esta mensagem a Hirão: ‘Tu bem sabes que foi por causa das guerras travadas de todos os lados contra meu pai Davi que ele não pôde construir um templo em honra do nome do Senhor, o seu Deus, até que o Senhor pusesse os seus inimigos debaixo dos seus pés. Mas agora o Senhor, o meu Deus, concedeu-me paz em todas as fronteiras, e não tenho que enfrentar nem inimigos nem calamidades. Pretendo, por isso, construir um templo em honra do nome do Senhor, do meu Deus, conforme o Senhor disse a meu pai Davi: ‘O seu filho, a quem colocarei no trono em seu lugar, construirá o templo em honra do meu nome’.” I Reis 1. 1-5